terça-feira, 15 de setembro de 2015

Carta a mim mesma

Querida Sylvia,
Você é adorável, mas quando quer ser chata, mesquinha, cri-cri e mal humorada, parabéns, consegue ser das mais bem-sucedidas criaturas que conheço. Reconheça também que há em você um hábito entranho de se diminuir. Não deu para ver, a esta altura da vida, o quanto já conquistou?
Meu bem, você passou a infância morando em uma fazenda longínqua, depois foi morar em Jacarepaguá (subúrbio do Rio de Janeiro) e, veja só, transita hoje em dia por onde quiser, cria uma filha sozinha – uma criança adorável aliás,  superou medos que só mesmo você para saber da imensidão de um pânico, tem amigos verdadeiros e uma bela empresa de comunicação. Ou seja, já percebeu que pode fazer o que quiser, quando quiser.
Eu sei, eu sei, você vive na cidade grande mas o interior não sai de você, ainda há muitos medos, a demanda é imensa e de todo lado e, o mais difícil, encontra-se novamente se perguntando qual será o seu lugar no mundo. Ora, tenha paciência, não pense. Já passou por isso uma vez quando era adolescente e se inventou. Vai conseguir de novo.
Te conheço. Suas frases preferidas são:
-       - Sal, por favor?
-       Vou fumar um cigarrinho (e dá aquele sorriso meio que se desculpando por ser um alienígena);
-       - Me apaixonei por Portugal;
-       - Olha que lindo...  -, e aponta para algum arranjo de flor, ou tronco de árvore, ou para um quadro do Modigliani, um prédio lisboeta de azulejos ou para uma simples xícara de café.
-       - Só gosto de praia se puder sair do quarto e por os pés na areia;
-       - Saudades da minha avó Yedda;
-       . Saudades da loira;
-       Não aguento mais esta solidão (isto vc não diz por aí).
Viu como te conheço? Tem ainda sua eterna briga com a balança! Jesus, mulher, se quer emagrecer, mude de profissão e pare de beber vinhos todos os dias. Se não, melhor aceitar que você come nos melhores restaurantes e tem a chance de beber bons vinhos, gins e afins, como poucos que conheço.
Agora voltou com aquele papo de que está cansada; muito cansada. Que nunca vai encontrar alguém para dividir as contas, as tarefas cotidianas; que já desistiu de encontrar um parceiro/companheiro/amigo/homem ideal para compartilhar a vida. Pode parar, querida. Não tem ninguém porque não quer; porque mais parece uma leoa líder de bando, porque espera um super-homem entrar pela janela e que ele seja perfeito. Vê se fica mais quietinha, se mostre como é, como a pessoa frágil que é, fale menos verdades em qualquer roda e observe mais. Hora de ser pavão é hora de fechar negócio, e só. Me ouviu bem?
Minha queridíssima, você merece o melhor dessa vida. Não tem bons amigos à toa. Você é generosa, carinhosa, dá boas gargalhadas e fala bobagens como ninguém. Relaxe e vai levando.
Já aprendeu tanto, mas tanto. Já está livre de tantas amarras que te prendiam. Aproveita este Alentejo pelo qual tanto sonhou e programou; aproveita este espírito livre pelo qual tanto trabalhou na análise e tome mais um gole deste tinto. Mal não vai fazer e viva o seu momento. Ponto final.
Te amo e sem mais,
Eu.





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